domingo, 25 de janeiro de 2009

Imersão

Lembro que quando eu estava na primeira assessoria de imprensa em que trabalhei, era viciada no meu trabalho. Eu atendia, entre outras, a conta de uma fábrica de brinquedos, e adorava. O ambiente de trabalho no escritório era muito bom, descontraído, alegre, livre. Lá, fiz amizades que duram até hoje. Eu amava meu trabalho e isso era altamente estimulante. Conseguia ter idéias criativas, vivia aquilo não só no horário de expediente, mas a cada minuto do meu dia. Gostava tanto que não conseguia me desligar e isso chegou a criar desavenças com meu namorado na época. Lembro que em uma viagem de férias, 15 dias longe de São Paulo, não conseguia desgrudar do celular e torcia pra que ele tocasse com notícias do escritório. Ele percebeu e me disse, meio de saco cheio: "Vai, liga logo". Eu fiz cara de criança contente quando ganha um doce e telefonei. Nenhuma notícia demais, mas fiquei satisfeita.
Uma vez, em uma das conversas cabeça com o Daniel, que é biólogo, perguntei pra que o homem tinha sido feito. Ele disse que fomos feitos para a contemplação. Eu acho que é isso mesmo, a gente nasce pra testemunhar a beleza do mundo e tirar o maior prazer possível da vida. Só que desde que o mundo é mundo foi implementada a regra de que o homem precisa trabalhar para sobreviver, o que rouba o tempo que teríamos para admirar o mundo. O problema é que, em geral, o trabalho é visto como sofrimento, como castigo. E quem é obrigado a fazer algo que não quer, não faz bem feito. O melhor é unir o útil ao agradável, e fazer o que dá prazer. O que nos dá prazer é o que a gente faz bem, porque faz com facilidade e leveza, sem sacrifício algum. O filme O Curioso Caso de Benjamin Button fala um pouco disso, que toda pessoa tem que descobrir o seu talento e aproveitá-lo, para que possa olhar com orgulho a própria vida.
Segundo meu guru, Domingos de Oliveira, o homem que consegue fazer o que ama e ganhar dinheiro com isso tem que ter as mãos beijadas. E acho que esse homem, que faz o que ama, não vê o trabalho como trabalho, mas como a própria vida. Por isso, se diverte no trabalho e trabalha nas horas vagas, mesmo sem perceber. Nada forçado, tudo espontâneo. O fotógrafo britânico Rankin, que está com a exposição de retratos
Chop off their heads, no MuBE, diz no texto de apresentação da exposição que ama fotografia e ama mulheres (ele já fotografou as mais lindas e famosas), por isso não encara o trabalho como trabalho, e sim um grande hobby que dá dinheiro. Da paixão pelo que faz é que vem o olhar sensível e crítico e a criatividade, que tornam seu trabalho especial.
Pessoas assim não pensam em aposentadoria, porque nunca vão conseguir deixar de fazer o que gostam.
Acho que quem descobre seu talento e o transforma em trabalho torna a vida (sua e dos outros) melhor, mais fácil e mais bonita. Mas, às vezes, não é tão fácil enxergar nosso talento, mesmo quando está debaixo do nosso nariz. E, pior ainda, às vezes, mais difícil que enxergar é assumir.
Porque é difícil assumir, como diz Rankin, um hobby como um trabalho. É que hobby é fácil, divertido, e trabalho é duro e suado. A gente costuma desvalorizar o que faz bem e com facilidade, por não ver que o que é fácil pra gente pode ser difícil pro outro. E pode ser fazer conta, pescar, pintar, construir casa, desenhar móveis, costurar, contar histórias, fazer programas de computador, cuidar de bicho ou estimular pessoas. São coisas que, nas horas de dificuldade, ao invés de dar vontade de abandonar tudo, nos estimulam ainda mais. O importante é que no produto venha embutido aquela sensação boa que você teve ao fazer e que vai ser percebida por quem olhar o trabalho no final.
O que eu quero dizer é que muita gente já me falou que é preciso fazer coisas que a gente não gosta ou não concorda pra ter dinheiro pra fazer o que gosta. Mas isso vai diretamente contra ao meu jeito de ver a vida. Porque eu acho que a gente não vive só depois das 18h da tarde ou só no final de semana ou só no mês de férias, ou só depois da aposentadoria. A vida acontece todos os dias e se a gente não tem o mínimo de prazer na rotina, acaba se tornando uma pessoa frustrada, estressada, desiludida, que vai chegar no dia da morte e pensar: O que eu fiz?

2 comentários:

Joao Gabriel disse...

É essencial a paixão pelo trabalho, concordo plenamente. Só faço uma ponderação. Por mais que amemos nosso trabalho (eu amo o meu), vai haver crises, momentos de conflito, dias ruins etc. -- assim é a vida. A gente não pode nunca deixar que esses percalços minem nossa paixão. Este também é um grande desafio.

Pollyana Barbarella disse...

Se você diz, eu acredito e sigo. De olhos fechados.